O internacionalismo sindical na era de Seattle O presente texto é uma versăo preliminar de um artigo entretanto publicado num volume organizado por Waterman e Wills (2001), e retoma, actualiza e desenvolve um extenso texto baseado num trabalho em curso (Waterman, 1999) bem como investigaçăo já publicada em forma de livro (Waterman, 1998a e 2001a). Além disso, tem por base um conjunto de diversos outros artigos, recensőes e reflexőes inéditas (Waterman, 1998b). A maior parte destes materiais pode ser consultada na página Global Solidarity Dialogue/Dialogo Solidaridad Global (cuja referęncia é fornecida na secçăo Websites, no final deste texto). Os meus agradecimentos a Kim Scipes, a Bruce Nissen e, em especial, a Dan Gallin e Jane Wills, pelos seus comentários a versőes anteriores do artigo. Se de alguma maneira descurei ou entendi mal as perspicazes sugestőes que me fizeram em privado, espero ter oportunidade de, em público, poder vir a responder ŕs suas reacçőes.
Reconhecendo a existęncia de uma profunda crise mundial que atravessa a esfera do trabalho, este texto propőe: uma crítica do internacionalismo sindical do período nacional/industrial/colonial; uma reconceptualizaçăo do sindicalismo e do internacionalismo operário adequada a um período de capitalismo globalizado/conectado em rede/informatizado; o diálogo do milénio sobre a esfera do trabalho e a globalizaçăo; uma das novas abordagens académicas da esfera do trabalho a nível internacional e do internacionalismo operário; o papel da comunicaçăo, da cultura e das novas tecnologias da informaçăo e da comunicaçăo. A conclusăo salienta a centralidade da interconectividade reticular, da comunicaçăo e do diálogo para a criaçăo de um novo internacionalismo operário.
Introduçăo
É sobejamente reconhecido, tanto no interior do movimento operário como ŕ sua volta, que a esfera do trabalho (entendida na sua múltipla acepçăo de trabalho assalariado, de uma identidade de classe, de actividade sindical, de interlocutor com voz activa nas relaçőes com a indústria, de movimento social democrático-radical, e de parte integrante da sociedade civil) vive hoje uma crise profunda. E isso é tanto mais verdade quando ele é entendido como movimento internacional numa época em que a velha ordem capitalista internacional se vę confrontada com os desafios colocados pela nova desordem capitalista global. A recuperaçăo desta situaçăo vai exigir năo só uma crítica do internacionalismo operário tradicional, mas também todo um trabalho de reconceptualizaçăo, além de novos tipos de análise e um novo diálogo – e uma dialéctica nova – entre as partes interessadas. Para tanto, aqui se adiantam, uma após outra, as seguintes propostas: 1) uma crítica do internacionalismo sindical do período nacional/industrial/colonial (NIC)1; 2) uma reconceptualizaçăo do sindicalismo e do internacionalismo operário adequada a um período de capitalismo globalizado/conectado em rede/informatizado (GCI); 3) o diálogo do milénio sobre a esfera do trabalho e a globalizaçăo; 4) uma das novas abordagens académicas da esfera do trabalho a nível internacional e do internacionalismo operário; 5) o papel da comunicaçăo, da cultura e das novas tecnologias da informaçăo e da comunicaçăo (TIC). A conclusăo salienta a centralidade da interconectividade reticular, da comunicaçăo e do diálogo para a criaçăo de um novo internacionalismo operário.
1. Internacionais sindicais e o período nacional/industrial/colonial
A análise que se segue deve ser cotejada com a que é feita por Dan Gallin (1999a), que na qualidade de antigo Secretário da International Union of Food and Allied Workers (IUF – Sindicato Internacional dos Trabalhadores da Alimentaçăo e Associados) tem marcado presença, năo só de forma activa como através das suas reflexőes críticas, no internacionalismo operário e sindical. A este propósito v. também Gallin (1999b, 2001).
Existiram e existem ainda outros tipos de organizaçăo sindical “internacional” para além daquelas que aqui me proponho tratar: uma organizaçăo de inspiraçăo social-cristă e de implantaçăo pouco mais que marginal, actualmente com a designaçăo World Confederation of Labour (WCL – Confederaçăo Mundial do Trabalho, CMT); organizaçőes autónomas regionais, como a Organisation of African Trade Union Unity (Organizaçăo para a Unidade Sindical Africana); e inclusivamente a US American Federation of Labour-Congress of Industrial Organisations (AFL-CIO – Federaçăo Americana do Trabalho-Congresso das Organizaçőes da Indústria), que durante dezenas de anos funcionou como se fosse uma internacional paralela e concorrente, a que năo faltavam as respectivas instâncias e dinâmicas regionais! Terei, no entanto, que me circunscrever ao caso da International Confederation of Free Trade Unions (ICFTU – Confederaçăo Internacional dos Sindicatos Livres, CISL) e a duas outras estruturas que com ela mantęm ou mantiveram importantes relaçőes. A World Federation of Trade Unions (WFTU – Federaçăo Sindical Mundial, FSM), representante da tradiçăo comunista de internacionalismo sindical e que foi a grande rival político-ideológica da CISL durante a Guerra Fria; e a ITF, International Transportworkers Federation (Federaçăo Internacional dos Trabalhadores dos Transportes, FITT), um dos grandes Secretariados Profissionais Internacionais (ITSs – SPIs) ligados ŕ área da indústria. Representando um tipo de internacional anterior ŕ CISL, a FITT foi e continua a ser marcada por uma certa concorręncia com a CISL e com o seu sindicalismo baseado no Estado-naçăo. A vitória político-ideológica da CISL na Guerra Fria e o estado de confusăo ou crise em que mergulhou com o advento da globalizaçăo neoliberal deixam ainda em aberto, pelo menos, a questăo de saber se é nas internacionais de matriz nacional ou nas de matriz industrial – ou noutras de natureza inteiramente diversa – que reside a resposta mais adequada com vista a um novo internacionalismo sindical, operário ou geral na presente era de globalizaçăo (v. adiante).
A Confederaçăo Internacional dos Sindicatos Livres é uma organizaçăo centenária com uma longa tradiçăo atrás de si. Apoiada pela esmagadora maioria dos sindicatos nacionais dos países do Norte e tendo saído vitoriosa da guerra fria no terreno sindical, ela recrutou para as suas fileiras os maiores sindicatos nacionais radicais dos países do Sul. Além disso, reclama para si um número de membros que ascende aos 124 milhőes, perfilando-se para vir a incorporar ainda, no futuro, os da China e da Rússia2. Sendo assim, por que razăo é posta hoje em causa, vivendo, inclusivamente, num estado de autoquestionamento? Porque esta confederaçăo internacional continua, em minha opiniăo, a ser a expressăo do capitalismo nacional/industrial/colonial (NIC) que lhe deu o ser e a forma. A CISL é uma confederaçăo internacional de federaçőes sindicais de carácter nacional(ista), por sua vez representantes históricas do operário (do sexo masculino) da indústria pertencente ŕs grandes empresas capitalistas ou estatais e desejosas de obterem da parte do patronato ou dos respectivos governos o devido reconhecimento, protecçăo e representaçăo năo só ao nível do próprio Estado-naçăo como ao nível dos demais Estados. É esta uma tradiçăo que coexiste em simultânea cooperaçăo e concorręncia com o taylorismo (a linha de montagem de produçăo em massa), o fordismo (em que os trabalhadores recebem o mínimo necessário para que possam tornar-se consumidores em massa dos produtos que ele próprios fabricam), o keynesianismo (em que a redistribuiçăo social e a riqueza săo determinadas pelos índices de crescimento) e o nacionalismo de Estado (em que os trabalhadores săo encarados como cidadăos nacionais, isto é, como alguém que se define por uma relaçăo de oposiçăo, de concorręncia e até mesmo de guerra com os demais). A ideologia, as instituiçőes e os procedimentos associados ŕ ideia de “parceria social” passaram a ser hegemónicos depois da criaçăo, em 1919, da International Labour Organisation (ILO – Organizaçăo Internacional do Trabalho, OIT), debaixo de uma considerável pressăo do movimento operário. A CISL interiorizou a natureza tripartida da OIT3. A essa natureza tripartida veio juntar-se, durante o período da Guerra Fria, a ideologia do sindicalismo “livre”, o que levaria ŕ tendęncia para identificar a CISL com o “mundo livre” liderado pelos Estados Unidos da América4. A isso acresceu ainda, agora que se assistia ao desmoronamento do colonialismo (de que a CISL foi cúmplice), a ideologia do “desenvolvimento” a caminho de uma utopia social, implicitamente inspirada quer num certo modelo de tipo sueco, quer na cornucópia de riqueza e abundância oferecida pelo modelo californiano. A organizaçăo internacional foi edificada segundo a matriz da época, ou seja, em termos de um corpo assente no Estado-naçăo e que formalmente se apresentava com sendo democrático-representativo, além de primordialmente vocacionado para a concorręncia/cooperaçăo com as outras internacionais sindicais e para a actividade de “lobbying” dos órgăos inter-estatais. O internacionalismo daqui resultante foi um “internacionalismo nacional”, traduzido na conquista de direitos e de padrőes sociais-democratas no interior do Estado-naçăo democrático-liberal e na conquista desses mesmos Estados-naçăo por parte dos trabalhadores a quem eles eram negados (casos da África do Sul do Apartheid e da Polónia comunista).
Por ocasiăo do 50.ş aniversário da CISL, um número especial da Trade Union World (1999), revista oficial da organizaçăo, apresentava-se com o seguinte título: “Como a CISL Influenciou os Grandes Desenvolvimentos a Nível Global ao Longo dos Anos”. A verdade, porém, é que a impressionante história recente da CISL (Linden, 2000) – que comunga desta perspectiva institucional-desenvolvimentista – revela estar este seu meio século de existęncia recheado de aspectos muito problemáticos, nomeadamente no que refere ŕ manutençăo de relaçőes estreitas e até simbióticas com determinados Estados, com o capital, com impérios e blocos (dentro do próprio mundo ocidental!), e inclusivamente com os respectivos serviços de espionagem. Igualmente posta a nu, e de igual modo problemática, é a dimensăo da dependęncia da política da CISL relativamente ŕs principais organizaçőes nórdicas nela filiadas, bem como das lutas intestinas – ainda que habitualmente discretas ou ocultas – travadas entre os seus principais sindicatos e funcionários. Com efeito, a leitura deste livro deixa-nos com a sensaçăo de que a CISL năo corresponderá propriamente ŕ tradiçăo mais marcante e ŕ força impulsionadora mais significativa do movimento operário internacional, revelando-se antes como uma agęncia ou grupo de pressăo internacional com ligaçőes a outras organizaçőes de empregadores nacionais e inter-estatais, divorciado do quotidiano concreto dos operários e do trabalho destes nas fábricas. Esse sentimento é reforçado pela leitura da Conclusăo do capítulo correspondente ao período 1972-década de 90, onde se citam as palavras de um proeminente dirigente nacional nórdico proferidas no Congresso de 1975: Năo sei qual é o número de pessoas nos vossos países que tęm uma conscięncia profunda da existęncia da CISL, mas eu pessoalmente desconfio que no meu próprio país esse número é muito reduzido… (516)
Rebecca Gumbrell-McCormick, autora do capítulo em causa – que de resto assume as dimensőes de um livro – (2000), admite este reparo e reconhece, ela própria, outras limitaçőes. Contudo afirma que
muitos trabalhadores em África, no Chile ou noutras regiőes em conflito, onde colegas seus tęm sido presos ou assassinados e outros tęm sido salvos através da intervençăo da CISL ou das suas organizaçőes filiadas, terăo por certo a conscięncia perfeita da existęncia desta, quer a conheçam pelo nome ou năo. (517)
Mesmo admitindo que assim é, estas palavras sugerem uma entidade que tem mais a ver com o Comité Internacional da Cruz Vermelha do que com uma organizaçăo internacional do tipo movimento social (para usar uma bem apropriada expressăo americana). Há que evitar demonizar a CISL ou minimizar-lhe a importância. Se tivesse sido vontade dos trabalhadores ter uma CISL (ou um qualquer organismo sindical internacional) de tipo diferente, ter-se-iam organizado no sentido de atingir esse objectivo. Tem, pois, talvez todo o cabimento ver a CISL como uma estrutura de cunho defensivo e autolimitativo. Uma estrutura que, além disso, funciona no âmbito e sob a alçada do capitalismo NIC, năo obstante encontrar-se sujeita ŕ concorręncia do sindicalismo comunista do Leste e do sindicalismo radical-nacionalista/populista do Sul.
Apesar de ter sofrido um quase completo desmoronamento, e de quase năo ter hoje uma existęncia digna desse nome, a referida concorręncia comunista continua a năo ser desprovida de interesse. As origens da Federaçăo Sindical Mundial remontam ŕ aliança inter-estados (os Aliados) que derrotou a aliança fascista (o Eixo) na II Guerra Mundial5. Mas essas origens residem também na vaga de empatia popular, operária, democrática, nacionalista e revolucionária que acompanhou essa vitória. Que a dinâmica do movimento se subordinou ŕ dinâmica inter-estatal, mostra-o a velocidade com que, entre 1947 e 1949, a FSM se fracturou em funçăo das linhas de divisăo criadas pela Guerra Fria. Mas a rapidez com que essa fractura se deu deveu-se igualmente a uma guerra fria anterior a essa: uma guerra que opusera os sindicatos sociais-democratas aos comunistas e que remontava aos tempos em que os comunistas fundaram o Profintern, ou Internacional Vermelha de Sindicatos (RILU – IVS), no ano de 1920 (MacShane, 1992). Após a fractura de 1949, a FSM assegurou, para além dos sindicatos controlados pelo Estado pertencentes ao bloco comunista, o domínio dos sindicatos ocidentais com direcçőes comunistas, e também dos sindicatos comunistas e de alguns dos sindicatos de orientaçăo radical-nacionalista dos países do Sul. Ao procurar expandir-se para esta regiăo do mundo, de aspecto tăo promissor, a FSM acabaria por reproduzir – ainda que com uma inferior probabilidade de ęxito – as relaçőes clientelares dos sindicatos do Ocidente. As actividades de solidariedade, de divulgaçăo e de formaçăo que entăo desenvolveu visavam mais o recrutamento de aliados para o mundo comunista entre os meios sindicais e o aparelho estatal do que o aumento da combatividade, da autonomia e da conscięncia de classe, a confrontaçăo com o capitalismo, ou o derrube do Estado autoritário (com a excepçăo dos Estados subordinados ao Ocidente). Assim, e a título de exemplo, veja-se como, ao longo de 50 anos de história, a FSM “revolucionária” nunca produziu nada sobre o tema de como organizar uma greve, fosse de âmbito nacional ou internacional6. De facto, a principal actividade da FSM parece ter-se resumido ŕ organizaçăo de congressos internacionais, todos eles marcados pelo apelo ŕ “reunificaçăo do movimento sindical internacional” e pela reiterada conclusăo sobre a necessidade de reunir um novo congresso.
Na altura da invasăo soviética da Checoslováquia, em 1968, o operariado checo năo quis saber da FSM – de cuja existęncia, de resto, năo tinha sequer conscięncia -, năo obstante esta se encontrar sediada em Praga. O Secretariado da FSM encheu-se momentaneamente de alguma coragem democrática e proletária ao condenar a invasăo, tendo sido provavelmente a única organizaçăo frentista internacional de orientaçăo comunista que alguma vez criticou a Uniăo Soviética. Contudo, esse pequeno gesto de autonomia, que já de si pecou por tardio, iria ser completamente anulado no decurso de uma reuniăo do Conselho realizada alguns meses depois. Quando o representante de um sindicato maoista japonęs se preparava para falar, foi-lhe desligado o equipamento de traduçăo automática, facto bem revelador da falęncia desta organizaçăo precisamente no mesmo ano em que, por todo o mundo, o autoritarismo e o conservadorismo eram postos em causa nas ruas.
A FSM continua, hoje, a existir, e a existir num duplo sentido, qual deles o mais problemático. Em primeiro lugar, existe sob a forma de um número de escritórios modestos e de funcionários modestamente pagos, e de uma série de congressos e de publicaçőes extraordinariamente parecidos com os de há 30 anos atrás. Em segundo lugar, ela persiste como mito, perpetuado por sindicalistas de esquerda, activistas militantes, ou anti-imperialistas, bem como por alguns investigadores de esquerda da nova geraçăo. Poderia pensar-se que estes buscam uma alternativa ŕ CISL, fazendo-o, contudo, olhando para trás e para o lado em vez de olharem para a frente. O único sinal de que a FSM aprendeu alguma coisa com as lutas travadas contra o capitalismo contemporâneo foi a criaçăo, em 2000, do seu “website” (v. Websites, no final). Mas esse “sítio” na “Web” é também a prova viva de que a FSM continua a estar fortemente dependente da participaçăo de sindicatos controlados pelo Estado, provenientes do que resta dos países comunistas e do mundo árabe. Quanto ao mais, este resquício da tradiçăo romântica e insurreccional – mas também típica do socialismo de Estado – parece querer regressar ao mundo dos Estados-naçăo que lhe esteve na origem.
A busca de alternativas ŕ CISL é hoje marcada por preocupaçőes e desafios de uma bem maior contemporaneidade. Um deles tem a ver com aquilo que deve ser o papel de uma confederaçăo literalmente internacional em tempos de globalizaçăo. A CISL é uma instituiçăo formalmente enfeudada a sindicatos de índole nacional(ista), e enfeudada também – considerando o que sempre foi a sua política, historicamente dominada pelo poder e pelo dinheiro – aos seus membros mais ricos e poderosos. Além disso, situa-se no cume de uma estrutura em pirâmide que a coloca a uma distância considerável – e multiplamente filtrada – dos verdadeiros operários, gente de carne e osso7. A CISL é, ademais, uma instituiçăo solidamente incrustada num universo tradicional composto por instituiçőes inter-estatais, que dispende muitas das suas energias a fazer lóbi junto destas. O segundo grande problema, a meu ver, é a invisibilidade da CISL. Pense-se no que é uma organizaçăo com 124 milhőes de membros – um número, ainda por cima, em expansăo -, mas com uma presença absolutamente nula na cultura e nos media globais, sejam eles dominantes, populares, ou alternativos.
A CISL está a mudar. A dimensăo e os limites dessa mudança ficaram bem patentes aquando do seu Congresso do Milénio, realizado em Durban, na África do Sul, no ano 2000 (v. South African Labour Bulletin, 2000). Reflectindo sobre o evento pouco tempo após a sua realizaçăo, Bill Jordan, Secretário Geral da CISL, afirmou:
[E]m períodos de mudança revolucionária, e é num período desses que nos encontramos hoje, temos que ser capazes de pensar e de agir para além da camisa de forças das nossas tradiçőes… Mais uma vez o movimento sindical necessita de ideias novas para fazer face ŕquilo que săo as novas necessidades de novos operários, novas profissőes, novas formas de organizaçăo do trabalho, e novas relaçőes de emprego. (Jordan, 2000)
O Congresso tomou, por isso, a decisăo de submeter a organizaçăo a uma grande “exame do milénio”, por forma a fazer frente aos desafios com que se vę confrontada. A verdade, contudo, é que năo dispomos de qualquer indicaçăo de que tal exame irá ser levado a cabo na presença sequer dos sindicatos seus filiados, e muito menos ainda com a participaçăo dos membros desses sindicatos membros, nem após consultas com as organizaçőes democrático-radicais e internacionalistas que a CISL anda, presentemente, a cortejar.
Os Secretariados Profissionais Internacionais (SPIs), săo as mais antigas organizaçőes sindicais internacionais, atravessando actualmente um processo de fusăo, consolidaçăo e redefiniçăo. Tratarei aqui apenas daquele que melhor conheço e sobre o qual mais se tem escrito. A Federaçăo Internacional dos Trabalhadores dos Transportes teve origem na vaga de protestos e de acçőes de mobilizaçăo dos trabalhadores deste sector que teve lugar especialmente na Europa da última década do século XIX e das tręs primeiras décadas do século XX8. Durante o período entre as duas Grandes Guerras constituiu uma parte significativa do internacionalismo sindical social-democrata que se opôs ŕ ascensăo do fascismo ao mesmo tempo que mantinha a distância relativamente ŕ Uniăo Soviética. Além disso, a FITT afirmou-se por via da sua relaçăo com a OIT, criada para resolver “o problema social” que sobreveio ŕ I Guerra Mundial. Apesar de ter entăo passado a integrar os processos internacionais de negociaçăo colectiva, a FITT continuou a apoiar a mobilizaçăo de massas e as acçőes de âmbito internacional na área da indústria. Além disso, produziu (ou abrigou) um dirigente sindical social-democrata de apreciável estatura histórica e de grande relevância para o seu tempo: Edo Fimmen9. A organizaçăo apoiou activamente os movimentos antifascistas e sindicatos clandestinos no interior dos Estados fascistas. Durante a II Guerra Mundial năo só contribuiu de maneira significativa para o esforço de guerra antinazi desenvolvido pelo Reino Unido e pelos Estados Unidos como dele também recebeu apoio, descobrindo assim os benefícios da colaboraçăo com os Estados democrático-liberais e com as respectivas actividades de espionagem10. A cooperaçăo da FITT com os serviços de informaçăo dos EUA durante a II Guerra Mundial levou ao seu posterior envolvimento com a CIA durante a Guerra Fria e em particular ŕ repressăo violenta dos sindicatos dos trabalhadores portuários comunistas na França e na Itália, bem como ŕ repressăo ainda mais violenta do sindicalismo comunista e radical-nacionalista na América Latina e em África.
Durante o meio século que se seguiu a 1945, a FITT evoluiu no sentido de se transformar pelo menos num secundário “actor transnacional” no contexto do “sistema internacional” (Reinalda, 1997). Especialmente significativa, neste aspecto, é a prolongada campanha desenvolvida pela FITT relativa aos trabalhadores da marinha mercante subordinados ŕs chamadas Bandeiras de Convenięncia (BC), no que foi considerado um modelo de internacionalismo sindical num contexto de globalizaçăo. Os navios BC encontram-se registados fora da alçada das autoridades governamentais ou dos sindicatos nacionais, junto de Estados especialmente receptivos aos interesses dos grandes armadores, e as tripulaçőes săo contratadas ainda noutros países, a fim de assegurar uma măo-de-obra barata. Nestas circunstâncias, as acçőes concretas de carácter solidário tęm muitas vezes partido de trabalhadores de fora desta indústria específica. A actividade da FITT no âmbito das BC implica o envolvimento da organizaçăo em negociaçőes internacionais e traduz-se no estabelecimento de acordos colectivos também de âmbito internacional, incluindo um fundo para assistęncia social cobrado pelos armadores mas gerido pela FITT. Graças a essas acçőes, a FITT conseguiu năo só recuperar milhőes de dólares em salários atrasados devidos ŕs tripulaçőes, como também assegurar uma funçăo de assistęncia adequadamente financiada. Hoje em dia, dezenas de inspectores portuários nomeados pela entidade sindical ou por ela aprovados acompanham e prestam apoio aos trabalhadores da marinha
mercante por todo o mundo. Levanta-se, contudo, a questăo de saber se o que aqui temos năo será uma situaçăo invertida, em que a FITT presta serviços reconhecidamente valiosos a uma măo-de-obra terceiro-mundista que năo exerce qualquer controlo, directo ou sequer indirecto, sobre a entidade que a beneficia.
Historicamente, os trabalhadores portuários filiados na FITT desempenharam um papel importante de solidariedade com estes trabalhadores da marinha mercante claramente provenientes de outros países e outros sectores da indústria. Por outro lado, quando os trabalhadores portuários de Liverpool, também eles filiados na FITT, apelaram ŕ solidariedade internacional no decurso da greve – uma greve heróica e desesperada, mas nem por isso menos inovadora – que em 1995-8 travaram contra um entăo triunfante neoliberalismo britânico, a FITT dispunha de pelo menos duas razőes para lhes negar o seu apoio. A primeira é que eles eram, por assim dizer, súbditos de um determinado filiado nacional da FITT, o British Transport and General Workers Union, ele próprio relutante em apoiar plena e abertamente a greve. A segunda razăo é que, dado o seu papel de agente interveniente na negociaçăo colectiva em nome de tripulaçőes internacionais das BCs, aquela organizaçăo encontrava-se registada como sindicato ao abrigo da legislaçăo laboral anti-sindical britânica, estando por isso impedida de empreender as acçőes de solidariedade que lhe foram solicitadas sob pena de pôr em risco năo só os fundos a seu cargo mas também as suas próprias sedes. Um dos inspectores portuários da FITT na cidade de Săo Francisco demitiu-se, num gesto de público protesto contra a política da organizaçăo relativamente ŕ greve.
No que respeita ŕ política de transportes internacionais, questăo que desde há muito preocupa a FITT, parece que esta ainda
acredita num sistema de transportes racional, cooperativo, e publicamente planeado, objecto de um esforço de coordenaçăo tanto nacional como internacional por forma a prestar um serviço eficiente e integrado de transporte de mercadorias e de passageiros. Dada a funçăo social desempenhada pelos transportes, o seu planeamento deve prever a hipótese de benefícios e custos sociais mais amplos. A FITT considera que as actuais tendęncias internacionais no sentido da liberalizaçăo e da desregulamentaçăo dos transportes constituem um passo atrás relativamente a uma tal concepçăo de serviço público. Há que ter o engenho necessário para encontrar um meio-caminho entre “os extremos que săo uma indústria de transportes planificada e a sua completa liberalizaçăo”. (Reinalda, 1997: 31)
Esta política do meio-termo coloca a FITT lado a lado com os burocratas e os tecnocratas mais racionais e de mais largas vistas da cena internacional, ao mesmo tempo que aceita – e que efectivamente assume – os parâmetros do capitalismo. Tal facto, em si mesmo, é consentâneo com uma visăo burocrática do internacionalismo enquanto relaçăo existente năo tanto entre trabalhadores como entre organizaçőes sindicais nacionais. A circunstância de a FITT estar, efectivamente, a reconhecer os movimentos sociais ora emergentes parece também sugerir uma aliança com organizaçőes năo governamentais (ONGs) de âmbito nacional e internacional, em vez do estabelecimento de contactos directos entre trabalhadores e activistas de movimentos aliados. Se é certo que os SPIs hăo-de continuar a existir, năo há razőes para pensar que se encontram devidamente apetrechados para enfrentar os novos tempos. Săo muitas as características que estas estruturas apresentam em comum com a CISL. E se ainda é possível detectar-lhes restos de alguma especificidade “industrial” tradicional, a verdade é que elas estăo a ser objecto de uma rápida erosăo devida ŕs próprias alteraçőes registadas na estrutura do capital e ŕ vaga de fusőes em curso nos SPIs, em grande parte motivadas por uma estratégia defensiva. Essas fusőes só excepcionalmente lograrăo responder de maneira satisfatória ŕ esquiva geometria do capital, que com rapidez crescente muda, hoje em dia, de lugar, de produtos/serviços, de propriedade, e de formas de emprego11.
Estou convencido que tanto a CISL como a FITT virăo forçosamente trazer elementos novos ao velho modelo de sindicalismo internacional. Quanto ŕ FSM, é bem provável que năo venha a ser mais do que um sério aviso daquilo que pode suceder quando năo se é capaz de assumir a tradiçăo, reconhecer as exigęncias do presente, e proceder ŕ autoreformulaçăo que se impőe para enfrentar o futuro. Se năo quiser ficar para sempre refém do próprio passado, nostalgicamente procurando um regresso a um suposto período áureo de parceria entre a esfera do Trabalho, o Estado, e o Capital, o sindicalismo internacional terá seguramente de chegar a um entendimento do internacionalismo operário consentâneo com a desordem capitalista globalizada em que vivemos12.
2. Como conceber um novo internacionalismo operário
É cada vez mais frequente ouvir-se falar, tanto nos meios académicos como nos sindicais, de uma espécie de “sindicalismo de movimento social” com âmbito internacional ou global (Ashwin, 2000; Bezuidenhout, 1999; Moody, 1997). Ao mesmo tempo, contudo, existe uma estranha relutância em conceptualizar esta tendęncia (e, nesse aspecto, Munck, 2000, constitui, em parte, uma excepçăo). Vou, por isso – e também no propósito de provocar uma reacçăo crítica -, apresentar aqui tręs esboços de conceptualizaçăo inter-relacionados entre si e que se me afiguram relevantes para esta questăo.
Um novo sindicalismo social13. Entendo que um modelo deste tipo deverá ser um modelo capaz de superar os modelos de sindicalismo “económico”, “político”, ou “político-económico” actualmente existentes. Para tanto, é necessário que tenha em linha de conta todos os tipos de actividade laboral, que assuma formas socioculturais, e que esteja voltado para a sociedade civil. Um modelo sindical deste tipo deverá, além disso, apresentar, entre outras, as seguintes características:
– Deve centrar a sua luta na área do trabalho assalariado, combatendo năo apenas por melhores salários e melhores condiçőes mas também pelo aumento do controlo, por parte dos trabalhadores e dos sindicatos, do processo laboral e das políticas relacionadas com o investimento, a inovaçăo tecnológica, a relocalizaçăo, a subcontrataçăo, as políticas de educaçăo e formaçăo. Estas estratégias, bem como as lutas inerentes, deverăo ser levadas
a cabo em permanente diálogo e em acçăo combinada com as comunidades afectadas e tendo em conta os respectivos interesses, de maneira a evitar conflitos (por exemplo com grupos ambientalistas ou de mulheres) e a maximizar o poder mobilizador das reivindicaçőes;
– Deve bater-se contra os métodos e as relaçőes de trabalho de tipo hierárquico, autoritário e tecnocrático, a favor de produtos socialmente úteis e amigos do ambiente, assim como pela reduçăo do horário de trabalho, pela distribuiçăo do disponível e do necessário, pela partilha do trabalho doméstico, e pelo aumento do tempo livre com vista ao autodesenvolvimento cultural e ŕ realizaçăo pessoal;
– Deve manter uma relaçăo estreita com os movimentos de outras classes ou categorias năo sindicalizadas ou năo passíveis de sindicalizaçăo (o sector informal, os que trabalham a partir de casa, os agricultores, as donas-de-casa, os técnicos e as profissőes liberais);
– Deve manter uma relaçăo estreita com outros movimentos democráticos, de natureza năo-classista ou multiclassista (como sejam movimentos de base associados ŕ igreja, movimentos de mulheres, de moradores, de ambientalistas, de pacifistas, de direitos humanos, etc.), num esforço comum com vista ŕ criaçăo de uma sociedade vivil forte e diversificada;
– Deve manter uma relaçăo estreita com outros (potenciais) aliados, sempre com o estatuto de parceiro autónomo, igual e democrático, năo reivindicando para si – nem aceitando subordinar-se a – qualquer organizaçăo ou poder “de vanguarda” ou “soberano”;
– Deve fazer suas as novas causas sociais que forem surgindo na sociedade em geral, ŕ medida que estas se forem colocando aos trabalhadores em particular ou se expressem no interior do sindicato (causas como a luta contra o autoritarismo, o majoritarismo, a burocracia, o sexismo, o racismo, etc.);
– Deve privilegiar a democracia no local de trabalho e promover as relaçőes directas e de tipo horizontal, seja entre os trabalhadores propriamente ditos, seja entre estes e outras forças sociais democrático-populares;
– Deve mostrar-se activo na área da educaçăo, da cultura e da comunicaçăo, estimulando a cultura operária e popular, apoiando iniciativas tendentes a fortalecer a democracia e o pluralismo tanto dentro como fora das instituiçőes ou dos media dominantes, seja no plano local, nacional ou global;
– Deve abrir-se ao funcionamento reticular intra- e inter-organizacional, dando mostras de compreender a importância que as associaçőes, as alianças e os grupos de interesses, constituídos numa base informal, horizontal e flexível, podem ter para estimular a inovaçăo, o pluralismo e a democracia organizacional.
Diversos autores, ao longo dos anos, tęm identificado o “sindicalismo de movimento social” com 1) certas organizaçőes nacionais específicas, 2) certas tendęncias sindicais de cariz militante ou de esquerda, e 3) o Sul14. Isto, em minha opiniăo, é errado năo só do ponto de vista analítico como também do ponto de vista teórico e estratégico. Do ponto de vista analítico, tende a identificar como sendo “sindicatos do tipo movimento social” as organizaçőes sindicais envolvidas em diversos tipos de aliança popular-laboral, sobretudo em tempos de movimentaçőes (semi-)insurreccionais contra regimes autoritários militares ou de direita. Do ponto de vista teórico, tende a reduzir uma categoria conceptual a analítica, impedindo desse modo que seja aplicada criticamente ŕ evidęncia oferecida. Do ponto de vista estratégico, tende a tomá-la como característica de uma regiăo específica do mundo – e isso numa altura em que a globalizaçăo homogeniza/diversifica o mundo de maneiras e formas que simultaneamente exigem e possibilitam a procura de alternativas universais (que năo universalistas).
Um novo internacionalismo operário. Preocupado com os problemas do capitalismo GCI (de que as relaçőes inter-estatais constituem apenas um aspecto), este modelo terá que ter conscięncia de que faz parte de um movimento de solidariedade global, com o qual tem a aprender e para o qual deve contribuir. Um novo tipo de internacionalismo operário implicará, entre outras coisas, o seguinte:
– Deve passar do plano das relaçőes internacionais entre sindicatos ou funcionários sindicais para o plano das relaçőes face-a-face entre as partes interessadas e directamente ligadas ao mundo laboral, seja ao nível do próprio local de trabalho, da comunidade, ou de outras organizaçőes de base;
– Deve abandonar o modelo de organizaçăo internacional em forma de pirâmide – um modelo por demais centralizado, burocrático e rígido -, estimulando para tanto o modelo dinâmico, descentralizado, horizontal, democrático e flexível que caracteriza as redes de informaçăo internacionais;
– Deve trocar o “modelo da ajuda” (fluxos unidireccionais de dinheiro e bens provindos de sindicatos, trabalhadores ou outras entidades “ricas, poderosas e livres”) pelo “modelo da solidariedade” (fluxos bi- ou multidireccionais de apoio em termos políticos, de informaçăo e de ideias);
– Deve passar das meras declaraçőes de intençőes, dos apelos públicos e dos congressos bem intencionados, para se traduzir em acçőes políticas, em trabalho criativo, em visitas ou ainda em contributos financeiros directos (que continuarăo a revelar-se necessários) por parte dos trabalhadores interessados;
– Deve procurar que a solidariedade internacional seja praticada em funçăo das caręncias quotidianas, das capacidades e dos valores expressos da populaçăo trabalhadora comum, e năo apenas dos seus representantes;
– Deve reconhecer que embora a esfera do trabalho năo seja o arauto privilegiado do internacionalismo, ele lhe é, no entanto, essencial, articulando-se por isso com outros internacionalismos democráticos por forma a reforçar as lutas pela melhoria de salários e a ir para além do mero internacionalismo obreirista;
– Deve ultrapassar a dependęncia ideológica, política e financeira da solidariedade internacional. Para tanto, deve procurar financiar as actividades internacionalistas com recurso a fundos públicos ou a contributos dos trabalhadores, e prosseguir actividades de investigaçăo e uma orientaçăo política independentes;
– Deve trocar os constrangimentos político-financeiros, os conluios privados e os silęncios públicos dos internacionalismos tradicionais por um discurso entre iguais que seja franco, amistoso, construtivo e público, além de acessível a todos os trabalhadores interessados;
– Deve reconhecer que năo existe um lugar ou um nível exclusivo para o combate internacional, e que embora o ponto de partida para esse combate possa ser o local de trabalho, as organizaçőes de base ou a comunidade, as instâncias formais de tipo tradicional podem ser igualmente utilizadas e, inclusivamente, influenciadas;
– Deve reconhecer que o desenvolvimento de um novo internacionalismo obriga a ir colher contributos aos movimentos de trabalhadores do Ocidente, do Leste, do Sul e de outras regiőes sócio-geográficas, com os quais se impőe igualmente a constante troca de ideias.
É possível ver elementos deste modo de pensar tanto nas declaraçőes como na prática das instâncias sindicais internacionais. Considero, de resto, que ele se está a transformar no senso-comum do internacionalismo operário de esquerda (v., por exemplo, Lambert, 2001), apesar de haver ainda quem pareça achar que o internacionalismo operário (ou mesmo sindical) é quem lidera, ou devia liderar, a nova vaga de lutas contra a globalizaçăo neoliberal (Open World Conference, 2000a). Outros, no entanto, começam hoje a ir além desses tipos ideais, propondo alternativas globais – alternativas de carácter democrático e operário/popular – ŕ “globalizaçăo-a-partir-de-cima”, tanto em termos programáticos como em termos relacionais (Brecher et al., 2000).
Impőe-se uma última palavra no sentido de melhor clarificar e distinguir os conceitos de “internacionalismo”, “internacionalismo operário”, e “internacionalismo sindical”. No discurso dos movimentos sociais, o internacionalismo é normalmente associado ao mundo operário do século XIX, ao socialismo e ao marxismo. Podemos, inclusivamente, fazę-lo recuar no tempo, por forma a abranger os antigos universalismos religiosos ou o cosmopolitanismo liberal do Iluminismo. E devemos fazę-lo avançar no tempo, de maneira a incluir formas como as lutas das mulheres/feministas, dos pacifistas, das forças anticoloniais, e em prol dos direitos humanos. Dado tratar-se destes dois últimos séculos, e de um “mundo de Estados-naçăo”, precisamos de uma palavra nova para referir a era da globalizaçăo. Alguns autores falam de transnacionalismo. Eu prefiro a expressăo solidariedade global, por traduzir năo apenas a globalizaçăo mas também o mal-estar que provoca e as alternativas que se nos colocam. Quanto ao internacionalismooperário, refere um vasto leque de ideias, estratégias e práticas, passadas e presentes, relacionadas com a realidade da esfera do trabalho, e que văo desde a actividade das cooperativas e dos partidos operários e socialistas até ao papel dos intelectuais socialistas e ŕ cultura, passando pelos meios de comunicaçăo e, inclusivamente, pelo desporto. Quanto ao internacionalismo sindical, restringe-se ŕ forma preferencial de auto-articulaçăo dos trabalhadores (quer dizer, de auto-organizaçăo e auto-expressăo) durante o período NIC. Na parte final do século XX, o internacionalismo sindical desalojou ou sobrepujou o internacionalismo operário a tal ponto que os dois termos acabaram, em grande parte, por se tornar sinónimos. Contudo, nesta nossa era de capitalismo GCI é precisamente o internacionalismo sindical que se encontra mais em crise e que mais é posto em causa.
Na secçăo que se segue irei debruçar-me – ŕ luz do que atrás ficou exposto – sobre os modos como a esfera do trabalho a nível internacional, ou o internacionalismo operário, está ou năo a conseguir dar resposta aos novos movimentos de solidariedade global. Mais uma vez, a análise continuará a centrar-se nas instituiçőes sindicais internacionais de tipo tradicional, bem como na questăo das formas e dos procedimentos.
3. O Diálogo do Milénio sobre a Esfera do Trabalho a Nível Internacional
“Diálogo do Milénio sobre a Esfera do Trabalho a Nível Internacional” é o nome que dou a algo que existe no plano empírico e que me proponho aprofundar no plano programático. No período 1999-2000 assistimos a um número crescente de diálogos sobre a esfera do trabalho e a globalizaçăo, quer entre os sindicatos, quer entre os trabalhadores propriamente ditos, quer ainda entre as forças socialistas ou no meio académico. Torna-se evidente que tais diálogos foram estimulados pela circunstância de o final do milénio ter coincidido com aquilo a que chamamos “crise da globalizaçăo”. Esta expressăo, por sua vez, designa năo apenas a crise que a esfera do trabalho atravessa mas também a que caracteriza o próprio projecto da globalizaçăo neoliberal enquanto tal. Entre os congressos que sobre o tema tiveram lugar, é de salientar, antes de mais, essa grande iniciativa internacional que foi a Conference on Organised Labour in the 21st Century (COL21 – Congresso sobre Organizaçăo Sindical no Século XXI; v. Websites, no final). Promovido pela CISL e pela OIT nos anos de 1999-2000, foi um congresso electrónico de carácter aberto e bilingue. Por outro lado, tenho conhecimento, sobretudo nesse mesmo período de 1999-2000, de nove ou dez outras realizaçőes internacionais relacionadas com o mundo do trabalho e centradas na temática neoliberalismo/globalizaçăo. Neste caso, tratou-se de iniciativas quase sempre periféricas – ou transversais, ou exteriores – ŕs estruturas sindicais internacionais de tipo tradicional.
COL21: diálogo de qual milénio? Năo obstante o formato electrónico, a possibilidade de acesso internacional, e o carácter aparentemente aberto, trata-se de facto de um diálogo em larga medida espartilhado pela própria história dos seus dois patrocinadores e pelo interesse de ambos em preservar ou restaurar a centralidade que já detiveram no panorama das relaçőes laborais internacionais. Com uma excepçăo apenas – a de Richard Hyman (1999a), especialista de esquerda em assuntos do trabalho -, as declaraçőes introdutórias tanto dos convidados como dos patrocinadores institucionais ativeram-se aos tradicionais parâmetros discursivos das “relaçőes industriais”, da “parceria social” e do “desenvolvimento”. Outras palavras-chave, como por exemplo a “solidariedade internacional”, a “CISL” e a “OIT” – sem dúvida fulcrais, todas elas, para o futuro do trabalho sindical organizado -, năo foram objecto de discussăo, e muito menos de questionaçăo. Numa primeira análise do que se passou no COL21, diria que da lista dos participantes constavam os suspeitos do costume: indivíduos de raça branca, de provenięncia anglo-saxónica, e do sexo masculino (o mesmo se passando inicialmente com os proponentes da agenda, se se exceptuar o caso do chileno Juan Somavia, Director Geral da OIT). A maioria das comunicaçőes de fundo feitas a solicitaçăo da OIT limitaram-se ao tópico os-sindicatos-e-a-globalizaçăo-no-meu-país. Năo obstante os contributos plenos de informaçăo, e a ocasional assunçăo de posiçőes críticas por parte de algumas intervençőes, foi pouca ou nenhuma a reacçăo ŕs declaraçőes de abertura, além de năo se notar que houvesse diálogo entre os participantes. Aquando do lançamento do sítio de língua espanhola na “Web”, a maior parte das mensagens foi de cumprimentos. Se posteriormente este mesmo sítio ganhou mais vida, foi provavelmente por ter passado a contar com uma responsável mais dinâmica15. Além disso, alguma indagaçăo posteriormente levada a cabo a título pessoal, tanto nas Américas como na Europa Ocidental, é de molde a sugerir que os especialistas em assuntos do trabalho a nível internacional, e nomeadamente os de orientaçăo mais crítica, năo se manifestaram particularmente interessados em participar nesta experięncia, ainda que o possam ter feito com o estatuto de observadores mudos (isto é, através de uma participaçăo passiva). Nada disto, porém, significa que a experięncia deve ser desprezada. Pelo contrário, a presente crítica deve ser entendida como uma provocaçăo no sentido de que se empreenda uma investigaçăo sistemática sobre o COL21, incluindo o respectivo patrocínio e gestăo, os temas tratados, os discursos, a participaçăo e o impacto, e ainda as semelhanças/diferenças entre o sítio inglęs e o espanhol. A questăo fundamental, em suma, é que (e aqui atrevo-me a falar também pelo leitor) necessitamos urgentemente de um sítio de discussăo desse tipo, pois que na verdade ele ainda năo existe16
.
Os congressos năo-oficiais: que diálogo do milénio? Aos sete congressos a que atrás aludi há que acrescentar um importante precedente, realizado em 1988, e dois outros eventos surgidos já numa fase mais tardia, no final de 200017. Estas iniciativas tęm vindo a ter lugar nas margens – ou nas bases – institucionais, políticas, educativas e académicas das estruturas sindicais internacionais. A maioria teve lugar em países tradicionalmente do centro do capitalismo, mas em vários casos (Coreia, África do Sul, México, Brasil) năo foi assim. Além disso, na maior parte dos casos em que as realizaçőes tiveram lugar nos EUA, e tanto quanto é do meu conhecimento, houve participaçăo de membros de países do Sul, só excepcionalmente havendo participantes dos antigos países comunistas.
Já tive oportunidade, noutro local, de comentar um congresso/rede deste tipo (Waterman, 1999a), pelo que de momento me limitarei ao Congresso para um Mundo Aberto em Defesa dos Direitos Democráticos e da Independęncia dos Sindicatos (CMA), realizado na cidade de Săo Francisco entre 11 e 14 de Fevereiro de 2000 (OWC – Open World Conference, 2000b). Foi este, muito provavelmente, o maior de todos os eventos de carácter informal, com 560 participantes provenientes de 56 países, 200 dos quais de fora da América do Norte. Tratou-se de uma iniciativa trotskysta com intervençőes a cargo dos dirigentes do partido organizador, mas onde esta dimensăo esteve atenuada e que conseguiu envolver pessoas situadas fora da esquerda tradicional. Além disso, foi inteiramente financiada por sindicatos e por organizaçőes ligadas a movimentos comunitários e laborais, o que permitiu reunir a soma de 11 a 14 mil dólares necessária ŕ realizaçăo do evento. Foram nove os painéis realizados, dedicados aos mais variados tópicos: mulheres trabalhadoras, trabalhadores imigrantes, privatizaçăo e desregulamentaçăo, sociedade civil e ONGs, paz e autodeterminaçăo, racismo e direitos democráticos, integraçăo dos sindicatos nas estruturas empresariais e/ou estatais (a todos os níveis), o mundo do trabalho e o ambiente. Além disso, o congresso debruçou-se atentamente sobre a ONU e a OIT, considerando que tanto uma como outra tęm vindo a abandonar o papel que tradicionalmente lhes cabe e a deixar-se assimilar, numa posiçăo subordinada, no projecto de globalizaçăo neoliberal (Sandri, 1999). Tratou-se, em suma, de uma iniciativa notável e até heróica, reveladora da capacidade de um partido socialista de vanguarda de tipo tradicional para enfrentar a globalizaçăo neoliberal de uma maneira enérgica, ampla e com dimensăo internacional. A acrescentar a esse facto, ficou demonstrado que há organizaçőes representativas de centenas de milhares de membros dispostas a responder a um apelo deste género. Finalmente, o CMA viria ainda a criar o seu próprio sítio e a produzir um vídeo e relatórios impressos sobre os trabalhos (v. Vídeos, no final), encontrando-se muitos destes materiais traduzidos para outras línguas.
Quero, no entanto, levantar algumas questőes sobre certos aspectos deste evento, alguns deles comuns aos outros congressos “alternativos” já mencionados, outros semelhantes ao próprio congresso da CISL. O primeiro é o carácter defensivo de que se revestiu, e desde logo a partir do título. A linguagem utilizada é a linguagem da resistęncia militante: “denunciar”, “preservar”, “desviarmo-nos das (…) tentativas de cooptar”, “responder aos ataques”, “lutar contra”, “defender”, “travar”, “re-nacionalizar”, “recusar”. Năo se vislumbra aqui qualquer sinal da passagem (para usar a terminologia feminista da América Latina) “da oposiçăo ŕ proposiçăo”. O segundo aspecto é o pressuposto de que a classe trabalhadora é a vítima principal do neoliberalismo. A expressăo “classe trabalhadora” é, assim, alargada por forma a abarcar todos os pobres (mulheres, agricultores, povos indígenas, residentes urbanos), negando-se deste modo a estes qualquer outro interesse ou identidade significativos para além dos de trabalhadores pertencentes ao sexo masculino, a sindicatos e ao mundo urbano. Daqui decorre o terceiro aspecto, que é o pressuposto segundo o qual o movimento sindical inter/nacional é, ou deverá ser, a força dirigente necessária para proceder ŕ inversăo (sic) do neoliberalismo. E o pressuposto de que todas as instituiçőes năo-tradicionais – sejam as “ONGs”, a “sociedade civil”, “a chamada globalizaçăo”, e mesmo as fusőes de sindicatos a nível nacional ou internacional – săo, objectivamente, instrumentos do inimigo de classe, e que só vęm enfraquecer ou confundir a luta de classes (isto é tanto mais paradoxal quanto o CMA, ou a força que lhe subjaz, o International Liaison Committee – Comité de Ligaçăo Internacional, CLI -, é, ele próprio, uma ONG). Um sexto aspecto a referir săo as lacunas importantes. Apesar de haver uma sessăo sobre/de mulheres, a única reivindicaçăo do congresso neste domínio teve a ver com um mecanismo da OIT relativo ŕs licenças de parto; năo foi feita qualquer mençăo ao assédio sexual e aos direitos que lhe estăo associados, nada sendo dito portanto também a respeito da questăo do patriarcado no interior tanto do movimento sindical inter/nacional como do próprio CLI/CMA. E apesar de ter havido uma proposta feita por uma mulher no sentido da criaçăo de um comité internacional de mulheres operárias, a ser dirigido por mulheres, năo saiu dos trabalhos qualquer referęncia ao feminismo, năo obstante este ser sem dúvida a principal força teórica e ideológica a conferir forma e impulso ŕs lutas das mulheres trabalhadoras a nível internacional ao longo dos últimos 20 anos. Năo se ouviu – e é este o sétimo aspecto que pretendo referir – qualquer crítica ao sindicalismo internacional de tipo tradicional propriamente dito18. Finalmente, e em conformidade com isto, năo houve nenhum painel nem nenhuma declaraçăo – e muito menos houve qualquer discussăo – sobre o significado do internacionalismo, seja no passado ou no presente, seja ao nível dos sindicatos, da esfera do trabalho, do movimento socialista, ou a nível mais geral. O congresso foi, em resumo, marcado năo só por uma atitude de radical oposicionismo como também pela ideologia do obreirismo/classismo. O internacionalismo que lá houve foi em grande parte, e por defeito, o do período NIC.
Atrevo-me a fazer uma generalizaçăo – ou, se se preferir: a avançar com uma proposiçăo – respeitante ŕs realizaçőes de tipo informal: por norma elas tęm os pés assentes na nova terra da globalizaçăo neoliberal, mas muitas vezes tęm a cabeça no mundo das velhas ideologias e instituiçőes. Isto deve, obviamente, entender-se como uma crítica, mas deve ser também uma constataçăo. A maioria destes eventos, apesar de frequentemente inovadores, tem nos respectivos organizadores e participantes pessoas que ainda parecem sentir-se mais ŕ vontade com os discursos do imperialismo ou do nacional-proteccionismo; que continuam agarradas ŕ ideia de que as estruturas sindicais (e/ou o partido trabalhista/socialista) săo as principais ou as únicas instituiçőes a ter em conta na luta contra a globalizaçăo; que concebem o internacionalismo em termos de relaçőes entre sindicatos nacionais, locais, ligados ŕ indústria, ou baseados na realidade da empresa; e que entendem o diálogo internacional como uma “troca de experięncias”, e o plano nacional, as mais das vezes, como terreno privilegiado ou exclusivo da resistęncia e da reafirmaçăo. As próprias metodologias – năo obstante, por vezes, as intençőes em contrário – tendem a reproduzir as práticas que tradicionalmente caracterizam a actividade sindical e partidária. Alguns destes projectos ainda consideram que săo a voz privilegiada do novo internacionalismo operário (o congresso da vanguarda? A rede da vanguarda?). E mesmo quando năo tęm tais pretensőes, năo parecem dar-se conta ou ter conscięncia da existęncia dos demais, ainda que com eles coincidam no objecto da reflexăo e nos propósitos, e inclusivamente quando alguns dos seus participantes marcam presença em uma ou mais iniciativas das outras. Tudo isto năo só pode como provavelmente deve ser entendido como um sinal 1) da novidade que săo as redes e a conectividade reticular, e 2) da persistęncia do choque trazido pela globalizaçăo, numa altura em que os activistas inter/nacionalistas militantes lançam măo de ferramentas velhas no seu esforço para desalojar um capitalismo radicalmente transformado e que por isso mesmo (tal como acima se indica) exige ferramentas radicalmente transformadas também.
Tudo isto, a meu ver, săo razőes suficientes para năo se equacionar as referidas iniciativas informais em oposiçăo ao COL21, ou mesmo ŕs Conferęncias do Milénio organizadas pela CISL. Talvez que em certos aspectos, em determinados domínios e nalguns dos temas tratados, a CISL esteja ŕ frente do CMA (como por exemplo na questăo das mulheres e nas relaçőes com as ONGs). Considero, por isso, que devemos antes encarar todos estes congressos como um espaço internacional novo e uno, uma ágora (uma espécie de praça pública, lugar simultaneamente de encontro e de troca) de que se impőe fazer o novo mapa e de que está ainda por traçar o quadro completo.
4. Comunicaçőes, cultura e computadores: do espaço ao ciberespaço?
A necessidade de conferir uma forma comunicacional/cultural e electrónica ŕ esfera do trabalho e ŕ sua faceta internacionalista tornou-se agudamente patente por ocasiăo da “Batalha de Seattle” contra a Organizaçăo Mundial do Comércio nos finais de 1999. A iniciativa de realizar a manifestaçăo partiu de uma rede de ONGs – ou, melhor dizendo, de uma rede de redes de ONGs. Houve uma participaçăo significativa de representantes do mundo do trabalho a nível internacional, incluindo dos EUA, mas tanto quanto sei nem uns nem outros desempenharam qualquer papel na conduçăo deste acontecimento ou na definiçăo da sua natureza. De facto, o que se passou foi exactamente o inverso. Os participantes e os observadores internacionais ligados a estruturas sindicais mantiveram-se, por norma, afastados das partes do evento em que năo participavam ou que năo controlavam. A mobilizaçăo a nível internacional foi levada a cabo, em grande parte, através da Internet. As acçőes de protesto estiveram em larga medida a cargo da Direct Action Network (Rede de Acçăo Directa), com quem as pessoas receberam treino em formas de acçăo flexíveis e articuladas. Naomi Klein (2000) descreveu do seguinte modo toda a novidade e riqueza deste multifacetado evento:
Năo obstante (…) a sua base comum, estas campanhas năo confluiram no sentido de um movimento único. Pelo contrário, interligam-se de uma maneira estreita e intrincada, como os próprios “hotlinks” que asseguram a ligaçăo das páginas que tęm na Internet. Esta analogia năo é feita por acaso: a tecnologia comunicacional que torna estas campanhas possíveis e eficazes está a moldar o movimento ŕ sua própria imagem. Graças ŕ “Net”, as mobilizaçőes desenrolam-se com recurso a uma burocracia escassa e uma estrutura hierárquica mínima; os consensos forçados e os manifestos longamente negociados văo, assim, ficando para trás, dando lugar a uma cultura de constante troca de informaçőes, marcada por uma prática fluida e por vezes compulsiva (…) O carácter descentralizado destas campanhas năo é fonte de incoeręncia e de fragmentaçăo mas sim uma adaptaçăo razoável e até engenhosa ŕs mudanças verificadas no panorama da cultura em sentido geral. (23-4. Sublinhado meu. PW)
Contribuindo com cerca de 50% dos participantes, os sindicatos dos EUA tiveram um envolvimento tardio, organizaram actividades ŕ parte (num estádio e num salăo) e procuraram encaminhar a sua marcha para longe dos locais onde a polícia enfrentava com brutalidade a resistęncia dos manifestantes năo violentos (que năo deve ser confundida com a pequena minoria que entretanto se lançava sobre as multinacionais em High Street). Os sindicatos internacionais estiveram ausentes dos media dominantes, embora a sua visibilidade seja pouco maior nos vídeos alternativos feitos sobre o evento (v. Vídeos). Alguns dirigentes sindicais nacionais e internacionais ignoraram ou inclusivamente repudiaram a cautelosa política e a estratégia da AFL-CIO. Alguns dos maiores sindicatos dos EUA, bem como inúmeros sindicalistas, pura e simplesmente romperam as fileiras e juntaram-se ao resto dos manifestantes. Mas enquanto os ecologistas apareceram vestidos de tartarugas, os sindicalistas apareceram vestidos de… sindicalistas. E enquanto os sindicalistas năo-violentos expressavam a sua resistęncia correndo risco físico, os dirigentes dos EUA ajoelhavam durante alguns momentos, em atitude de oraçăo19. Resultado: esses 50% de sindicalistas tiveram direito a 5% de cobertura com imagem nos principais noticiários internacionais (que o mesmo é dizer, dos EUA)! Só se poderia atribuir este facto a um “tendenciosismo dos media” se as formas de expressăo utilizadas tivessem sido tăo originais, apelativas, aparatosas ou lúdicas como as dos demais manifestantes.
Tirando algumas excepçőes assinaláveis, o movimento operário internacional ainda năo compreendeu o significado de tudo isto. Jean-Paul Marthoz (2000), jornalista desde há muito ligado ŕ CISL, reconhece a centralidade crescente dos media no contexto do processo de globalizaçăo bem como o potencial que tanto os media como os seus trabalhadores encerram na luta contra a globalizaçăo. Contudo, em face da cobertura mediática que os grupos e as atitudes radicais tiveram em Seattle, este autor considera que a projecçăo pública conferida aos acontecimentos que ali tiveram lugar é razăo “mais para cautela do que para euforia”. E porque năo ambas? E porque é que – para voltar ao tema dos sindicatos e dos media – a esfera do trabalho a nível internacional năo surge identificada nem associada de uma forma significativa com o novo movimento internacional para a democratizaçăo das comunicaçőes (Voices 21)? Tudo indica que mais uma vez o mundo do trabalho a nível internacional se prepara para responder ŕ nova esfera pública globalizada e ŕs novas formas de expressăo colectiva em modo defensivo/agressivo, quando o devia fazer em termos de aprendizagem/criatividade.
Há muito já que é possível detectar, nas atitudes do sindicalismo internacional relativamente ŕs novas tecnologias da informaçăo e da comunicaçăo (TIC), este tipo de reacçăo verdadeiramente conservadora. Tal sentimento começou a fazer-se notar há quase 20 anos, quando a CISL recusou a oferta, por parte de um especialista de informática social-democrata da Escandinávia, de uma base de dados de livre acesso chamada – ironicamente, dadas as circunstâncias – Unite20. Hoje em dia a atitude mantém-se, assistindo-se ŕquilo que poderíamos chamar uma desastrada tentativa, por parte da CISL, de criar e controlar na Internet um domínio sob a designaçăo “sindicato” (isto é, “union”, a exemplo de designaçőes já existentes como por exemplo .com, .uk, ou .org)21. É com agrado que se assiste ao aumento, na “Web”, do número de sítios de estruturas sindicais internacionais a oferecer um acesso cada vez maior ŕ informaçăo sobre as actividades que desenvolvem. Mas isso năo passa de uma resposta atrasada ŕquilo que săo as virtualidades das TIC enquanto instrumento (mais rápido, mais barato e de maior alcance), năo enquanto ciberespaço (quer dizer, um outro tipo de espaço, com possibilidades ilimitadas no que se refere ao diálogo internacional, ŕ criatividade e ŕ invençăo/descoberta/desenvolvimento de novos valores, de novas atitudes e de novos diálogos). Assim, até mesmo esse novo e admirável sítio multi-sindical que é o Global Unions năo é mais que um serviço – um serviço do tipo magazine e de informaçăo, e eventualmente também de mobilizaçăo – maior, mais rápido e de maior alcance22. Trata-se, por conseguinte, primordialmente de órgăos de propaganda23, que só ocasionalmente poderăo servir para criar as práticas e os entendimentos dialécticos necessários a esta nossa nova realidade capitalista, tăo complexa e globalizada.
Para encontrar práticas mais adequadas ao novo clima da globalizaçăo, temos de procurá-las em meios de comunicaçăo de tipo mais marginal: por exemplo revistas como a International Trade Union Rights (“Direitos Sindicais Internacionais”, que publicou um extenso debate sobre a problemática questăo dos direitos e comércio internacionais); sítios da responsabilidade de ONGs e/ou de particulares, como o serviço noticioso (e năo só) Labourstart, de Eric Lee; ou ainda as propostas provocatórias de novos princípios de organizaçăo sindical apresentadas por Richard Barbrook, um homem de esquerda especializado na área das comunicaçőes. Barbrook concebe as TIC, năo como algo que os trabalhadores ou os sindicatos se limitam a usar, mas como algo que estes produzem e que por seu turno produz trabalhadores e, mais do que isso, trabalhadores carecidos de sindicatos de um outro tipo:
A exemplo do que sucede nas outras indústrias, os trabalhadores da economia digital emergente necessitam de defender os seus interesses comuns. A maioria das organizaçőes de trabalhadores existentes, porém, năo está a conseguir dar uma resposta suficientemente rápida ŕs mudanças verificadas nas vidas de quem trabalha. Apesar de criados para dar luta aos patrőes, os sindicatos da indústria foram também criados ŕ imagem da fábrica fordista: burocrática, centralizada e nacionalista. Para quem trabalha na economia digital, este tipo de organizaçăo tem muito de anacrónico. É, pois, necessário que em seu lugar sejam criadas novas formas de sindicalismo, capazes de representar os interesses do trabalhadores do sector digital. Para além da reforma das organizaçőes sindicais existentes, é altura de estes trabalhadores começarem também a cooperar uns com os outros servindo-se dos métodos que lhes săo próprios. Dado que já se encontram em linha, deveriam organizar-se no sentido de promover os seus interesses comuns através da Net. Um sindicato virtual assim constituído, a funcionar no interior da economia digital, deveria ainda pôr uma grande ęnfase nos novos princípios de organizaçăo do trabalho: uma ęnfase no artesanal, no reticular, e no global. (Barbrook, 1999)
Para uma compreensăo ainda mais geral do papel das TIC relativamente ao internacionalismo, proponho que novamente olhemos para além da perspectiva específica da esfera do trabalho, detendo-nos por momentos sobre o tema “Mulheres@Internet”:
As redes – redes de mulheres, ambientalistas, étnicas, e de outros movimentos sociais – săo um espaço de novos actores políticos e uma fonte de práticas culturais extremamente prometedoras. É, por isso, possível falar de uma política cultural do ciberespaço e da produçăo de culturas capazes de opor resistęncia, de causar transformaçőes, ou de apresentar alternativas aos mundos virtual e real dominantes. Uma tal política cibercultural poderá ser especialmente eficaz se preencher duas condiçőes: deve ter conscięncia dos mundos dominantes actualmente em vias de criaçăo pelas mesmas tecnologias em que as redes progressistas se baseiam (incluindo a conscięncia do modo como o poder funciona no mundo das redes e dos fluxos transnacionais); e deve fazer o vaivém constante entre a ciberpolítica (ou seja, o activismo político na Internet) e aquilo que designo por política do lugar, quer dizer, o activismo político praticado nos espaços físicos em que o utente da Net utiliza este meio e faz a sua vida. (Escobar, 1999: 32)
Conclusăo: conectividade reticular, comunicaçăo, diálogo
Aventei atrás a ideia de que o problema fundamental do internacionalismo sindical no contexto do capitalismo GCI se prende com as formas e as práticas, sendo que as formas e as práticas do sindicato săo fortemente marcadas pelo capitalismo NIC dentro do qual – e em relaçăo ao qual – ele tomou forma. Isso quer dizer que a crítica da burocracia, da estrutura hierárquica e da ideologia sindical (proverbial fonte de queixas por parte da esquerda tradicional) é um tanto descabida, para năo dizer deslocada no tempo. Faz-nos, de facto, falta um princípio de auto-articulaçăo novo ou mesmo alternativo, quer dizer, um meio que sirva simultaneamente de auto-organizaçăo e auto-expressăo dos trabalhadores, mas sobretudo que seja verdadeiramente adequado ao nosso tempo. (Faz falta, por outras palavras, um princípio que contrarie de uma maneira permanente e eficaz a reproduçăo da ideologia e da estrutura burocrático-hierárquica, a qual năo deixa de ter lugar também no interior dos sindicatos “radicais” e “revolucionários”).
Como transparece das duas últimas citaçőes, esse princípio é a rede, sendo a prática a conectividade reticular. Năo há que feiticizar a rede ou diabolizar a organizaçăo. A “conectividade reticular” é também uma forma de entender as inter-relaçőes humanas, pelo que podemos encarar uma organizaçăo em termos de rede, tal como podemos olhar para uma rede em termos organizacionais. Năo deixa, contudo, de ser verdade que a passagem do capitalismo NIC para o capitalismo GCI é também a passagem de um capitalismo organizado para um capitalismo reticular (Castells, 1996-8). É das redes e da conectividade reticular internacionais ligadas ao mundo do trabalho que hoje em dia tendem a surgir as novas iniciativas, traduzidas em factores como a velocidade, a criatividade e a flexibilidade. Quando os sindicatos, ou as forças socialistas, condenam ou simplesmente criticam as ONGs por falta de “democracia” ou de “representatividade”, mostram com isso que năo compreendem os novos princípios, formas e práticas dos movimentos sociais democrático-radicais. Estes tęm por preocupaçăo essencial a capacitaçăo através da informaçăo, de ideias, de imagens, de son et lumičre, de valores. Quando falamos de uma conectividade reticular, ou de redes – ou de ONGs – democrático-radicais, há que ter em mente que estas representam uma grande fonte de renovaçăo e de movimento, seja no seio da sociedade civil, com relaçăo ao capital e ao Estado, seja dentro de – ou entre – organizaçőes como os sindicatos. Um sindicalismo que se pretenda democrático-radical e internacionalista mas que năo entenda isto, está inevitavelmente condenado ŕ estagnaçăo. Além disso, a conectividade reticular sindical ŕ escala internacional estagnará também se năo perceber que faz parte de um projecto democrático-radical internacionalista cujo alcance vai muito para além dos sindicatos e dos problemas laborais.
“Conectividade reticular” é uma expressăo que tem mais a ver com comunicaçăo do que com instituiçőes. Ora a conectividade internacional da esfera do trabalho, se năo quiser reproduzir os valores dominantes do capitalismo GCI, tem que resultar – e tem que ser geradora – de um estilo de comunicaçăo e de um sentido de cultura democrático-radical. Chamo a isto uma “cultura de solidariedade global”. A ideia encontra expressăo particularmente viva em Voices 21 (1999), produto de uma rede internacional de especialistas com uma prática democrática – universitários, activistas, etc. – ligados ŕ área das comunicaçőes. Este movimento preocupa-se com questőes como o crescente acesso aos media, o direito a comunicar, a diversidade de expressăo, a segurança e a privacidade. Tal como acima ficou referido, é notória a ausęncia, neste novo movimento social, das organizaçőes sindicais internacionais. Isso deve-se, em parte, ŕ autodefiniçăo institucional dessas organizaçőes, e em parte ŕ circunstância de os trabalhadores das comunicaçőes terem tendęncia a recear tanto as “interferęncias públicas” no seu território quanto receiam os magnatas dos media ou a censura estatal. Mas a esfera do trabalho tem uma história cultural longa e rica, e foi capaz, no passado, năo só de inovar como inclusivamente de encabeçar movimentos culturais populares, democráticos, e até de vanguarda. O sindicalismo internacional tem, uma vez mais, de ultrapassar a sua autodefiniçăo redutora. Caso contrário, permanecerá invisível na cena mediática internacional, a qual năo só coloca cada vez mais desafios e exigencies como se está mesmo a substituir aos espaços institucionais enquanto lugar por excelęncia da contestaçăo e da deliberaçăo democráticas.
O debate é a continuaçăo da guerra por outros meios. A intençăo é derrotar ou destruir o outro, quer se trate de uma ideia, um movimento ou uma pessoa. O conversar, por outro lado, implica ouvir o outro, mas sem que isso signifique necessariamente que essa troca seja ultrapassada ou transformada noutra coisa qualquer. Quanto ao diálogo, implica uma dialéctica, um processo através do qual as posiçőes iniciais sofrem modificaçăo até se chegar a uma nova síntese. Quando, acima, me referi ao diálogo do milénio sobre a esfera do trabalho a nível internacional, falava numa perspectiva simultaneamente descritiva e prescritiva. Há efectivos debates e conversas a decorrer neste momento; é bom que uns e outras assumam forma dialógica, tanto dentro como fora do movimento operário internacional (Waterman, 2001a).
Uma nota pessoal: Tendo vindo da tradiçăo polemística do marxismo (incluindo o contributo de Lenine, cujas obras principais se acham desvalorizadas devido ao carácter polémico da respectiva forma e intençăo), tive que lutar para escapar dessa concha fechada, em direcçăo a algo mais parecido com uma conversa ou um diálogo. Uma outra concha, já se vę, é a “baba empolada dos académicos” (para usar a expressăo com que, em 1990 – por alturas do final do Período Glaciar do último movimento operário internacional – um funcionário sindical internacional reagiu a um trabalho meu sobre uma lista de discussăo relativa a questőes laborais). O facto de ao menos ter sido capaz de entabular uma conversa pública com Bill Jordan, Secretário-Geral da CISL (Waterman, 2000), é já um pequeno sinal de que os tempos podem estar a mudar. Existem outros indícios de que, quando confrontadas com críticas públicas, as instituiçőes internacionais ligadas ao mundo laboral estăo a começar a ultrapassar o modo defensivo/agressivo. Ao longo dos últimos anos tenho-me visto envolvido de forma crescente em situaçőes de diálogo significativo com pessoas ligadas ao mundo do trabalho e outros internacionalistas. Alguma dessa experięncia vem contada na obra do académico e activista internacionalista Rob Lambert, embora o presente artigo talvez năo deixe entrever que esse diálogo concreto começou há já 15 anos ou mais. Esse nosso diálogo, como é bom de ver, tem sido relativamente fácil, devido ŕ amizade pessoal e ao respeito mútuo que nos une, muito embora também năo tenha sido desprovido de tensăo e de alguma frustraçăo. Mais recentes, e também mais hesitantes, săo as trocas públicas – ou privadas – que tenho vindo a manter com organizaçőes e representantes sindicais a nível internacional. Se é certo que entre os meus amigos radicais ligados aos meios políticos e académicos estas conversas em privado podem ser consideradas um sinal năo só de ingenuidade da minha parte, mas também de assimilaçăo institucional, eu vejo esse conversar exactamente nos termos que acima referi, isto é, como uma experięncia ou experimentaçăo a partir da qual ambas as partes poderăo posteriormente evoluir no sentido de um diálogo aberto. Seja como for, năo estou interessado em manter conversas privadas – tal como năo me interessa fazer consultas ou avaliaçőes remuneradas – se năo tiverem em vista permitir o aperfeiçoamento de intervençőes públicas como esta, destinadas a fomentar o diálogo aberto. Gostaria que, năo obstante as duras críticas que aqui lanço ŕs instituiçőes de tipo tradicional, essa intençăo dialógica resultasse bem patente deste meu escrito. Assim os meus leitores me avisem, se năo for esse o caso (e um deles já mo fez saber).
A vantagem da “Web” para abordar as questőes relacionadas com o mundo do trabalho está em que ela năo se limita a tornar mais fácil o diálogo internacional e internacionalista. Com efeito, a própria lógica do computador é uma lógica de retorno, de “feedback”. A utilizaçăo unidireccional e centralizadora do computador, em que um utente se dirige a muitos destinatários numa perspectiva de controlo, constitui a negaçăo desta lógica e das possibilidades que encerra. Juntamente com a hipercapitalista “Web”, a Internet – ela própria também, por vocaçăo, eminentemente militar/industrial/comercial/estatista – săo subversoras das instituiçőes e da institucionalizaçăo capitalistas. Recordem-se as palavras de Marx, escritas (mais uma vez, algo premonitariamente) há 150 anos a propósito do próprio capitalismo:
Todas as relaçőes fixas e cristalizadas, com o seu séquito de preconceitos antigos e venerandas opiniőes, săo simplesmente postas de lado, e todas as que de novo se văo criando tornam-se antiquadas antes mesmo de terem tempo de ossificar. Tudo o que é sólido se dissolve no ar. (Marx e Engels, 1935: 209)
Năo há outro modo de funcionar, neste nosso mundo globalizado e na “virtualidade real” (Castells, 1996-8: vol. I: 327-375) que o cerca e que literalmente o informa, que năo seja vencendo este nosso medo de voar. Isso vai exigir de nós, enquanto internacionalistas ligados ao mundo do trabalho – quer nos situemos dentro das instituiçőes, nas periferias destas, ou noutros-locais-mas-nem-por-isso-menos-interessados-no-problema -, que nos tornemos, para usar as palavras de Enzensberger (1976), “tăo livres como o bailarino, argutos como o futebolista, e surpreendentes como o guerrilheiro”. E isso, por sua vez, exige – de todos nós, mais uma vez – que aprendamos a dialogar uns com os outros ŕ medida que prosseguimos nas nossas lutas; e que, caminhando e falando, vamos construindo uma estrada que nos conduza para lá do capitalismo24.
Lista das Siglas Principais
AFL-CIO, American Federation of Labour-Congress of Industrial Organisations
BC, bandeiras de convenięncia
CISL, Confederaçăo Internacional dos Sindicatos Livres
CLI, Comité de Ligaçăo Internacional
CMA, Congresso para um Mundo Aberto
CMT, Confederaçăo Mundial do Trabalho
FITT, Federaçăo Internacional dos Trabalhadores dos Transportes
FSM, Federaçăo Sindical Mundial
GCI, globalizado/conectado em rede/informatizado
NIC, nacional/industrial/colonial
OIT, Organizaçăo Internacional do Trabalho
ONGs, organizaçőes năo governamentais
SPIs, Secretariados Profissionais Internacionais
TIC, tecnologias da informaçăo e da comunicaçăo
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Vídeos:
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Showdown in Seattle: Five Days That Shook the WTO. VHS, NTSC. 150 min. Independent Media Project/Deep Dish Television, 339 Lafayette Street, New York, NY 10012. Email:
www.papertiger.org
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Ver lista das siglas principais no final do texto (nota do tradutor).
A principal fonte para conhecer a história da CISL é van der Linden (2000). Sarah Ashwin (2000) propőe uma crítica informativa e perspicaz do último período desta organizaçăo, em especial no que se refere ŕs suas relaçőes com o antigo mundo comunista. Esta autora suscita a questăo de estar presentemente a CISL a aproximar-se de um "sindicalismo de movimento social" (113), noçăo a que regressarei adiante. V. também Gallin (1999a).
A palavra "tripartido" sugere uma tarte partida em tręs partes iguais. Em termos de poder relativo, no entanto, o melhor símbolo da OIT deveria antes ser um bolo em camadas, uma vez que, cabendo 50% ao Estado (ou "governo") e 25% ao Capital (os "empregadores"), resta aos Sindicatos (o "mundo do trabalho") os 25% do fundo.
Há alguns anos a CISL mudou o título da sua revista oficial de Free Labour World para Trade Union World, parecendo dar assim mostras de reconhecer as ambiguidades e limitaçőes da palavra "livre".
Que eu saiba, a história da FSM ainda năo mereceu da parte da Universidade a atençăo que a questăo merece. Carew (2000) é autor de um breve mas equilibrado estudo sobre o tema. A caracterizaçăo que aqui faço baseia-se em parte na minha própria experięncia a trabalhar para a FSM na área da formaçăo sindical em Praga, entre 1966 e 1969. A partir de entăo tornei-me numa espécie de observador permanente da FSM.
Com efeito, a última vez que o sindicalismo comunista internacional levou a cabo um esforço do género parece ter sido durante o período da "Classe contra Classe" do Comintern, no final da década de 20 (National Minority Movement, s.d.).
Kjeld Aagard Jakobsen (2001), Secretário para as Relaçőes Internacionais da CUTB, principal confederaçăo sindical de esquerda do Brasil, defende mesmo que tanto a CISL como a FSM se baseiam no modelo bolchevique! Em minha opiniăo, o referido modelo bolchevique năo é senăo uma adaptaçăo do clássico modelo social-democrata alemăo. Quanto ŕ ideia de comparar/contrastar os modelos e o padrăo de comportamento da CISL e da FSM, em vez de as estudar em termos de oposiçăo, tem todo o aspecto de um projecto de doutoramento bonitinho.
Baseio-me aqui numa história colectiva da FITT, constante de um estudo da responsabilidade de Bob Reinalda (1997). V. ainda, no entanto, International Transportworkers Federation, 1996, e Couper, 1999. Para uma visăo mais positiva do papel dos SPIs v., mais uma vez, Gallin (1999a).
Deve-se a Fimmen um livro surgido nos anos 20 em que (algo prematuramente) se sustentava que o capitalismo europeu tinha tendęncia a unir-se, e que por esse motivo a ideia de uma confederaçăo internacional de centros sindicais fazia menos sentido, perante as novas circunstâncias existentes, do que uma formada por SPIs (Fimmen, 1924)!
Na sua correspondęncia particular, Dan Gallin sugere que foi o inverso que aconteceu, quer dizer, que foram os Estados e os respectivos departamentos especializados quem descobriu que era necessário cooperar com os sindicatos e com os SPIs, e que, além disso, os sindicatos năo tinham outra alternativa senăo aceitar essa cooperaçăo, caso desejassem ser eficazes na luta contra o fascismo. Pessoalmente, năo tenho objecçőes a esta interpretaçăo. Acho, porém, preocupantes as limitaçőes e as implicaçőes dessa cooperaçăo secreta. Com efeito, ela veio criar um terreno de operaçőes internacionais que conferiu aos sindicalistas com responsabilidades também internacionais um sentimento de que estavam a desempenhar um papel com uma importância histórica a uma escala mundial, mas sem a necessidade de participaçăo alargada dos restantes membros ou qualquer conhecimento público.
Destes, o projecto mais ambicioso é talvez aquele que ostenta também a designaçăo mais adequada: a Union Network International (UNI - Rede Internacional de Sindicatos), um SPI de "serviços e competęncias". No entanto, e como refere o próprio Congresso para um Mundo Aberto (Open World Conference, 2000a), esta organizaçăo năo só parece convencida de poder fazer frente ŕ vaga da globalizaçăo neoliberal como está efectivamente a construir um novo tipo de clientela e de gestăo sindical por forma a transformar-se num interlocutor válido do capital globalizado e das instituiçőes inter-estatais que o servem. É, assim, já possível fazer uma visita virtual ao Banco Mundial sem sair da sede virtual do sindicato.
Há poucos indícios de que este novo entendimento esteja para breve. A CISL está actualmente identificada com o "Pacto Global" da ONU, um tentativa das Naçőes Unidas no sentido de cair nas boas graças do capital multinacional e de ao mesmo tempo lhe conferir uma aura ética. Intervindo a propósito do mundo do trabalho, Kofi Annan, presidente da ONU, "pediu" ŕs gentes da area dos negócios a nível mundial que defendessem um conjunto de um conjunto de princípios de que se encontra excluída qualquer explicitaçăo do direito ŕ greve (ICFTU, 2000a, b). A CISL parece igualmente estar a ganhar as boas graças dessa grande potęncia mundial do futuro que é a China, năo obstante a aversăo deste país aos direitos dos trabalhadores e ŕ independęncia dos sindicatos (China Labour Bulletin, 2000). Finalmente, a CISL e alguns SPIs estăo também apostados na ideia de fixar uma "cláusula social" ou "padrőes laborais" através da Organizaçăo Mundial do Comércio, apesar do crescente descrédito em que tęm caído esta e outras instituiçőes financeiras internacionais (Gumbrell--McCormick, 2000: 508-15; Waterman, 2001b)
Deixo o conceito de "sindicalismo de movimento social", a que inicialmente fiz referęncia, para aqueles que, como veremos adiante, conferiram ŕ expressăo uma ampla projecçăo, ainda que traduzida em termos mais tradicionais ou "clássicos".
Ao afirmá-lo tenho em mente, antes de mais, os textos de Lambert e Webster (1988) sobre a África do Sul do apartheid, Munck (1988: 117) sobre o Terceiro Mundo em geral, Seidman (1994: 2-3) sobre a África do Sul e o Brasil, e Scipes (1996: viii-ix) sobre as Filipinas. Munck (2000: 93-4) precisou um pouco mais a sua formulaçăo, conferindo-lhe uma acepçăo mais lata. Quanto aos demais autores, nenhum propôs uma (re)formulaçăo mais ampla do conceito. Extremamente influente, nos tempos mais recentes, é já a utilizaçăo que Moody faz do termo, no seu impressionante retrato da situaçăo do mundo do trabalho ŕ escala global (1997). Com efeito, o último capítulo desta obra intitula-se 'Para um Sindicalismo de Movimento Social com mbito Internacional'! No entanto, o relato que Moody nos oferece deste fenómeno năo é mais que uma descriçăo/prescriçăo de um sindicalismo mais activista e democrático, ainda capaz de assumir o papel de direcçăo da classe operária na luta contra o neoliberalismo (290). Assim, embora apregoando um sindicalismo mais flexível, aberto e internacionalista, a proposta deste autor acha-se ainda tolhida pelos pressupostos obreiristas tradicionais. Seattle (v. abaixo) veio mostrar como, sob o capitalismo GCI, uma rede de movimentos sociais está em condiçőes de assumir uma perspectiva mais abrangente e uma estratégia mais sofisticada e mais militante do que as que caracterizam os trabalhadores ou os próprios sindicatos isoladamente. Assim, a afirmaçăo do papel de vanguarda da classe operária na luta contra o neoliberalismo pode revelar-se um gesto empiricamente errado e prescritivamente contraproducente.
Apesar das diversas tentativas que fiz para fazer chegar ao COL21 mensagens de diferentes tipos e de extensăo variável, e apesar ainda das diversas promessas de que uma delas seria divulgada, levou quase um ano até que tal sucedesse efectivamente - se bem que no sítio espanhol da "Web", e em inglęs!
Uma possível excepçăo será a Labor-List, de San Lanfranco (v. Websites, no final), onde já houve lugar a uma ou duas discussőes aprofundadas sobre certos temas relacionados com o mundo do trabalho a nível internacional. Fica-me, no entanto, a impressăo de que os participantes desta lista de discussăo ou năo estăo interessados em debater as questőes relacionadas com as organizaçőes e as instituiçőes internacionais, ou sentem-se pouco preparados para o fazer.
Segue-se a lista destas iniciativas, de que se fornecem as respectivas fontes, quando disponíveis, no final do presente artigo:
- Um evento "pré-milénio", patrocinado em 1998 pelo Sindicato Geral dos Trabalhadores Dinamarqueses por ocasiăo de um aniversário e subordinado ao tema Uma Nova Agenda Global: Perspectivas e Estratégias para o Século XXI;
- Uma iniciativa realizada no Brasil, em Setembro de 1999, sob o patrocínio de sindicatos e com o título Encontro Mundial Contra a Globalizaçăo e o Neoliberalismo;
- Uma iniciativa trotskysta intitulada Congresso para um Mundo Aberto em Defesa dos Direitos Democráticos e da Independęncia dos Sindicatos, realizada na cidade de Săo Francisco, em Fevereiro de 2000;
- Uma iniciativa de âmbito nacional e carácter sindical/académico/formativo, realizada em Milwaukee, Wisconsin, em Abril de 2000 sob a designaçăo Os Sindicatos e a Economia Global:
A Encruzilhada da Formaçăo Sindical;
- A segunda ediçăo de um festival/congresso internacional sobre a esfera do trabalho e os media electrónicos na era da globalizaçăo, intitulado LabourMedia99 e realizado em Seul, em Novembro de 1999;
- Um congresso sobre O Sindicalismo no Século XXI, organizado em Joanesburgo, em Outubro de 1999, pela Iniciativa do Sul sobre a Globalizaçăo e os Direitos Sindicais (SIGTUR);
- Um congresso internacional com o título Construir um Movimento Sindical para uma Mudança
Radical, organizado em Colónia, na Alemanha, em Março de 2000, por iniciativa de uma entidade baseada em Amesterdăo, a Transnationals Information Exchange, e que entre os seus principais tópicos contou com o tema "Um Novo Internacionalismo?";
- Um seminário sobre O Actual Panorama das Estruturas Sindicais Internacionais: Novos Desafios e Estratégias Sindicais em Face da Globalizaçăo, organizado na Cidade do México em Novembro de 1999 e com contributos estrangeiros/internacionais. Apesar de dirigido a um público nacional, este seminário partilhou das preocupaçőes e orientaçőes das iniciativas atrás mencionadas;
- Um "Workshop" sobre os Direitos Internacionais dos Trabalhadores e a Solidariedade Operária Internacional, realizada no Wellesley College, na regiăo de Boston, EUA, em Novembro de 2000 com o objectivo de propiciar a troca aprofundada de opiniőes entre especialistas das universidades, dos sindicatos e das ONGs e incluindo participantes da Ásia, da América Latina e de outras partes do mundo;
- LaborTECH 2000: Para Construir um Novo Sindicalismo Global através dos Media, Universidade de Wisconsin, Madison, EUA, 1 a 3 de Dezembro de 2000. O último de uma série de eventos deste tipo com alcance internacional e um índice de participaçăo significativo.
As críticas ao sindicalismo internacional que se fizeram ouvir dirigiram-se ŕs novas formas por este assumidas, e particularmente ŕ já referida Rede Internacional de Sindicatos. Embora houvesse críticas ŕ central norte-americana AFL/CIO, nomeadamente em conexăo com Seattle, o CLI/CMA deve ter-se sentido pouco ŕ vontade para criticar organizaçőes ŕs quais os participantes deviam lealdade.
Deixarei aos observadores americanos a tarefa de explicar as origens históricas exactas e o significado cultural daquilo que para mim constituiu um ritual estranho e até exótico.
A proposta em causa foi mesmo promovida publicamente no interior da CISL por Ian Graham (1982a, b), entăo editor responsável pela entăo chamada Free Labor World. Posteriormente Graham passar-se-ia para a International Chemical, Energy and Mineworkers Federation (ICEM - Federaçăo Internacional dos Trabalhadores do Sector Químico, da Energia e das Minas), uma organizaçăo bastante mais sensibilizada para o papel das comunicaçőes e da informática
Foi essa a conclusăo a que cheguei com base numa exposiçăo sobre o assunto feita por Eric Lee (2000). A CISL caracterizou-se, neste caso, por um pensamento burocrático, tecnocrático e territorialista. Burocrático na medida em que 1) visava uma relaçăo exclusiva entre órgăos ou funcionários de um determinado aparelho (sendo a outra parte a comissăo - dominada pelo mundo empresarial - incumbida da distribuiçăo de nomes de domínios na Internet) e porque 2) até ao momento năo foi objecto de publicitaçăo, nem de consultas com especialistas exteriores aos sindicatos, nem de mobilizaçăo dos membros da CISL, nem sequer de consultas junto do público interessado. Tecnocrático por acreditar que existe um remédio de natureza técnica para os problemas dos direitos democráticos relacionados com o mundo do trabalho. E territorialista porque a ideia era que fosse a CISL e os respectivos sindicatos membros ou aliados a decidir quais os sindicatos que săo "autęnticos", com direito, portanto, ŕ utilizaçăo do nome do domínio. A própria noçăo de criar um espaço territorial no ciberespaço sugere, enfim, uma falta de compreensăo do que este último seja. Lee aponta todo um conjunto de modos como é possível marcar uma presença sindical ao nível do ciberespeço e de achar na "Net" materiais com relevância para as questőes do trabalho sem precisar de recorrer ŕ criaçăo de um novo domínio. Ademais, essas modalidades afiguram-se acessíveis a todo e qualquer activista interessado, que para tanto só necessita, além do próprio interesse pelas questőes da solidariedade internacional, de se munir de imaginaçăo e das técnicas básicas para navegar na "Web".
Nem mesmo a melhor de todas as novas revistas sindicais impressas e de âmbito internacional, a Metal World, da International Metalworkers Federation (IMF - Federaçăo Internacional dos Metalúrgicos, FIM), dispőe de uma secçăo de cartas dos leitores, e muito menos ainda de um espaço aberto para o debate mais alargado. Compare-se essa lacuna com as duas páginas (em 16) facultadas pela Labor Notes, publicaçăo internacionalista produzida nos EUA.
Veja-se a definiçăo do termo dada pelo Shorter Oxford English Dictionary: "disseminar, difundir (uma declaraçăo, crença, ou prática)".
Se esta afirmaçăo evidencia um certa visăo utópica, é porque a utopia também é necessária ŕ reinvençăo do internacionalismo operário. Ao criticar as interpretaçőes contemporâneas do dilema com que nos debatemos, Ruth Levitas (2000) chama a atençăo para a necessidade de aliarmos o utopismo dialógico (o processo) ŕs antevisőes do que será a sociedade pós-capitalista (o lugar). R. Levitas, no entanto, recorda que uma noçăo indiferenciada da transformaçăo dialógica - ignorando, nomeadamente, os interesses cada vez mais conflituantes existentes no seio da sociedade capitalista contemporânea - terá como consequęncia que esses conflitos năo sejam detectados, deixando-nos no mesmo ponto em que nos encontramos. Recorrendo a um exemplo relevante para o tema aqui em apreço, a autora ilustra o seu ponto de vista com um documento da Comissăo Europeia que apela ŕ "solidariedade" entre aqueles cujo "rendimento é ganho pelo trabalho que realizam e os que o ganham [sic] por meio de investimentos" (208-9; "sic" da autora citada - PW). E Levitas sugere ainda que uma base significativa para um diálogo transformador exige que se proceda a uma análise crítica do capitalismo, apostada năo (só) em dizer que terrível que é, mas em identificar pontos potenciais de intervençăo - que por seu turno possam levar a uma transformaçăo - bem como agentes potenciais dessa mesma transformaçăo (209).
Published 4 October 2002
Original in English
Translated by
Maria Teresa Tavares
Contributed by Revista Crítica de Cięncias Sociais © Peter Waterman eurozine
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